Estou de passagem neste mundo,

Mas deixo aqui o registro de minhas palavras.

Eu sou o peregrino do tempo.


sábado, 21 de junho de 2008


As Horas Nuas

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É inefável qualquer tipo de resenha para explicar As Horas Nuas, romance de Lygia Fagundes Telles publicado em 1989 que (mais que merecido) arrebatou o prêmio Pedro Nava de Melhor Livro do Ano. Se é inefável, vou me ater ao próprio com uma ou duas gotas de seu oceano de misteriosa prosa da subjetividade humana.
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“acho deslumbrante ver o Bem e o Mal – com letra maiúscula – confundidos numa coisa só, cozinhando no mesmo caldeirão. (...) Mas parece que a graça está na meia-luz. Na ambigüidade”
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Notou os artifícios? Nem eu. Não precisa, ela é legítima, e assim legitima a literatura brasileira.
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“E os homens e mulheres olhavam para ele com respeito porque a beleza exige respeito”
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E assim nessa ambigüidade, nesse meio tom, que vai indo horas e horas dos personagens profundos dos quais a autora faz uso para expor a alma humana, expõe despudoradamente, e também denuncia a sociedade e a época. O texto é intimista ao extremo e prima pela narrativa arrastada que não cansa, pelo contrário, delicadamente vamos penetrando no cotidiano das personagens redondíssimas e em seus dramas existenciais, desenvolve história e personagens com confissões das mais íntimas, eu disse íntima? Olha eu repetindo. A narrativa briga com narrador para ver quem é mais real ou extraordinário. Rosa Ambrósio, a Rosa Rosae: atriz decadente que se fecha no seu apartamento milionário para se afogar no whisky que ou esconder-se na fumaça dos cigarros inúmeros e lembranças, peças do quebra-cabeça tão intrincado que acaba se mostrando um belo quatro, e que belo quadro temos aqui. Rosona lamenta-se enquanto tinge os pelos pubianos, mas nos conta que nem sempre sua vida foi fútil. Há o passado nas horas. E há também o seu gato narrando o que ninguém sabe e o que ninguém viu, às vezes ninguém o entende, de modo que lambe o cu com raiva e amor, só ele sabe os segredos daquela casa, mas é testemunha muda, não consegue contar, da sua boca salta o miado que dá origem ao seu nome, Rahul, mas calma, os leitores tem livre acesso aos seus pensamentos, suas lembranças de encarnações passadas, lá longe, na Roma antiga; e a descrição dos fantasmas que só ele vê. O surrealismo também habita nessa realidade, acaso o caviloso homem do sétimo andar que só chega junto com a noite, não é ele que se metamorfoseia em cavalo? Ora minha gente, não percam mais tempo lendo isso aqui, não vou dizer mais nada. Leiam As Horas Nuas e desfrutem de boas horas na companhia de um senhor livro. Palmas para Lygia. Faço das palavras do prêmio Nobel da literatura, José Saramago, as minhas quando ele assim revela:
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“Os livros de Lygia, afago com os olhos as páginas tantas vezes soberbas. Releio uma vez mais, palavra a palavra, sílaba a sílaba, saboreando ao de leve a pungente amargura daquele mel”
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SOBRE A AUTORA
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LYGIA FAGUNDES TELLES nasceu em São Paulo, mas passou a infância no interior do estado, onde o pai, o advogado Durval de Azevedo Fagundes, atuou como promotor público. A mãe, Maria do Rosário (Zazita), era pianista. Algumas das pequenas cidades percorridas nessa infância instável: Sertãozinho, Itatinga, Areias, Assis, Apiaí e Descalvado. Voltando a residir com a família em São Paulo, a escritora fez o curso fundamental na Escola Caetano de Campos, e em seguida ingressou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo, onde se formou. Quando estudante do pré-jurídico, cursou a Escola de Educação Física, da mesma universidade.
Lygia Fagundes Telles teve um filho do primeiro casamento, o cineasta Goffredo Telles Neto, que lhe deu duas netas, Lúcia Carolina Aidar da Silva Telles e Margarida Goreki da Silva Telles. Divorciada, a autora casou-se com o ensaísta e crítico de cinema Paulo Emílio Salles Gomes, falecido em 1977.
Segundo o crítico literário Antonio Candido de Mello e Souza, no texto "A nova narrativa brasileira", o romance Ciranda de pedra (1954) seria o marco de sua maturidade intelectual. Vivendo a realidade de uma escritora do Terceiro Mundo, LFT considera sua obra de natureza engajada, ou seja, comprometida com a difícil condição do ser humano num país de tão frágil educação e saúde. Participante e testemunha deste tempo e desta sociedade, a escritora procura através da palavra escrita apresentar esta sociedade e este tempo envolto na sedução do imaginário e da fantasia. Em seu romance As meninas (1973), ela registra uma posição de clara recusa ao regime militar. Em 1976, fez parte de um grupo de intelectuais que foi à Brasília entregar um importante manifesto contra a censura, o Manifesto dos Mil.
Membro da Academia Brasileira de Letras, Lygia Fagundes Telles já foi publicada em diversos países: França, Estados Unidos, Alemanha, Itália, Holanda, Portugal, Suécia, República Checa, Espanha, entre outros –, com obras adaptadas para TV, teatro e cinema.


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LIVROS PUBLICADOS PELA EDITORA ROCCO

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Ciranda de pedra (romance, 1954)
Verão no aquário (romance, 1963)
Antes do baile verde (contos, 1970)
As meninas (romance, 1973)
Seminário dos ratos (contos, 1977)
A disciplina do amor (ficção e memória, 1980)
Mistérios (contos, 1981)
As horas nuas (romance, 1989)
A estrutura da bolha de sabão (contos, 1991)
A noite escura e mais eu (contos, 1995)
Invenção e memória (ficção e memórias, 2000)
Durante aquele estranho chá (ficção e memória, org. Suênio Campos de Lucena, 2002)
Meus contos preferidos (antologia de contos, 2004)
Meus contos esquecidos (antologia de contos, 2005)
Histórias de mistério (coletânea de contos, 2004)
Conspiração de nuvens
ROTEIRO DE CINEMA
Capitu (1999), escrito em parceria com Paulo Emilio Salles Gomes e inspirado no romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, incluído no catálogo da Editora Cosak & Naify.
ANTOLOGIAS
Os melhores contos de Lygia Fagundes Telles, seleção de Eduardo Portella, Editora Global (1982).
Venha ver o pôr-do-sol e outros contos, Editora Ática (1997).
Oito contos de amor, seleção de Pedro Paulo Sena Madureira, Editora Ática (1997).
Pomba enamorada e outros contos escolhidos, seleção de Léa Masima, Editora LPM (1999).
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PRÊMIOS

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Afonso Arinos, da Academia Brasileira de Letras (1949)
Instituto Nacional do Livro (1958)
Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, por Verão no aquário (1965)
Grande Prêmio Internacional Feminino para Contos estrangeiros, França (1969)
Guimarães Rosa (1972)
Coelho Neto, da Academia Brasileira de Letras, Jabuti e APCA – Associação Paulista dos Críticos de Arte, pelo romance As meninas (1974)
PEN Clube do Brasil, para o livro de contos Seminário dos ratos (1977)
Jabuti e APCA, para A disciplina do amor (1980)
II Bienal Nestlé de Literatura Brasileira (1984)
Pedro Nava, Melhor Livro do Ano, para As horas nuas (1989)
Jabuti, Biblioteca Nacional e APLUB de Literatura, para A noite escura e mais eu
Jabuti e APCA, para Invenção e memória (2001)
Prêmio Camões (o maior prêmio da língua portuguesa), pelo conjunto da obra, Portugal – Brasil (2005)
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Ah, acabou de ganhar mais um prêmio quentinho. Não é possível (risos) ela deve ter um quarto em sua casa onde guarda todos esses troféus.
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APCA premia os maiores talentos da arte brasileira em 2007
Escritora Lygia Fagundes Telles vence a categoria na categoria livro de memórias com 'Conspiração de Nuvens' (esse é seu mais recente livro)
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Aplaudida de pé, "a grande dama da literatura", aos 85 anos, disse que "as nuvens também conspiram, cuidado!" assim como "outros amigos" para ela poder ser "lembrada pela segunda vez pela associação", que já a havia premiado anteriormente pelo livro As Meninas. A escritora finalizou seu agradecimento na noite de segunda, 5, citando versos de Castro Alves:
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"Bendito o que semeia
Livros... livros à mão cheia...
E manda o povo pensar!"


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6 comentários:

Somerset disse...

Kizzy..
Eu estava justamente procurando conteúdos sobre esta autora magnífica para um seminário que terei de apresentar. Não quero ser chata, mas será que eu teria sua permissão para usar alguns trechos do que escreveu sobre ela?
Bjs

Kizzy Ysatis disse...

Querida

Meu texto é só sobre o romance As Horas Nuas e vai até citação de Saramago, é claro que pode usar, contanto que credite a autoria.

Dali em diante (sobre a autora) o texto não é meu, são informações públicas que você encontra em qualquer biografia da imortal. Pode usar à vontade sem precisar creditar autoria porque as capitei na internet, bem como as fotos.

Boa sorte com o seminário! Será um sucesso!

Bjs

Somerset disse...

Realmente precisarei de sorte, fico muito nervosa ao falar em público, mas farei o possível pra dar tudo certo.

Muito obrigada

ebbios disse...

Quando poderei passar em sua morada para pegar os escritos (de sua autoria) q se referiu, e q estou curiosissimo para ler?

Anônimo disse...

Venha no fim de semana, ebbios, mas ligue antes e traga o vinho.

abs.

K.

Claudio Brites disse...

Olha que dá uma vontade de ler.
Sua resenha está digina de orelha.
e beijos