Estou de passagem neste mundo,

Mas deixo aqui o registro de minhas palavras.

Eu sou o peregrino do tempo.


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terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Dona menininha e o portão


Tem pessoas que passam por nós sem ficar em nossa história, não influem em nada e rapidamente são esquecidas; outras, porém, tornam-se parte do que somos e vivem para sempre em nossa memória. Tenho claramente as melhores lembranças de minha mãe guardadas no altar do coração. Lembro-me da primeira professora e eu, acalentado em seu colo, tendo sua mão paciente sobre a minha, apoiando-me quando a palavra escrita nasceu assim trêmula de meus dedos. E também me lembro da freira boa, dando-me comida na boca-criança, na ocasião em que estive no hospital porque um carro me pegou. Ela surgiu do mesmo modo que desaparecera: do nada. Mistério.
Acontece que, por aí, aparece muito anjo que parece gente, mas não é. Fato ruim. Contudo, eu nada temo, porque, por outro lado, a vida foi mostrando para mim que, aqui e ali, espalhadas pelo mundo, existem pessoas que são anjos.
                Há vinte e um anos voltei a morar em São Paulo e logo conheci dona Nilzete; alma gentil e pacífica. Senhora da segunda casa à esquerda depois da minha. Não foi difícil perceber que na calçada de dona Nilzete se localizava o centro do Universo da garotada do condomínio no qual eu acabara de chegar, pois em seu portão ela e o indócil Seu Lula, o marido, amor de sua vida, vendiam deliciosos geladinhos de todas as cores e sabores.
Depois dos geladinhos, vieram doces, salgadinhos e enfim os picolés de fruta, dos quais eu e outro vizinho, Seu Ricardo, nos tornamos consumidores frequentes. Uma alegre pausa para descanso e refresco das crianças que brincavam dia e noite na rua. Eu já não era tão criança, mas continuava moleque, esticando a infância.
Assim também fiz amizade com as filhas do casal; Adriana, Daniela e Valéria, a quem chamamos de Léo. Vale dizer que a filha da Adriana, a pequena Yoko, foi quem me apelidou de Kizzy. Era é família Funiga. O tempo passou, compartilhamos vivências profundas. Laços se estreitaram. Não apenas com os Funiga, alguns vizinhos deste condomínio são mais próximos a mim do que muitos familiares, e não estou falando de distância física.
Seu Lula era uma figura. Fazia-se de durão mas era tão doce quanto aqueles que vendia; outra criança a brincar no condomínio. Cineasta amador; dirigiu um curta-metragem com a turma da rua: “A história do papa figo”. Com Seu Lula, tomei banho na chuva. A propósito, ele e dona Nilzete até já me enfiaram debaixo de ducha para me curar de um pileque. Certa vez, estávamos no portão quando, por brincadeira, Seu Lula chamou dona Nilzete de dona menininha. O apelido pegou. Até hoje eu a chamo assim. Desenvolvi muito afeto por dona menininha.
Com o falecimento de Seu Lula, encerraram-se os doces. As crianças cresceram. Mas dona Nilzete continuava no portão. Quando eu saia, quando eu voltava, lá estava dona Nilzete, no portão. Ali não trocávamos apenas saudações. Dividíamos um cigarro, lembranças, conversas. Para ela, nós, que crescemos no condomínio, éramos eternas crianças. Suas crianças. Ela dizia: “Vocês são todos meus filhos”.
Há poucos meses, dona menininha adoeceu. Semana passada, sonhei com ela. Sonhei que lhe fazia uma sopa quentinha e gostosa com peixe e legumes. Contei para o Igor e ele me disse: “Então faz a sopa!”. Voei para a cozinha e a preparei rapidinho, mas com todo o amor e cheio de esperança. Dona Nilzete adorava peixe. Levei a sopa. Juntei-me a ela num abraço que não tinha pressa de acabar. Enchi-lhe de beijos. Disse-lhe que ia ficar tudo bem. E também disse: “Eu te amo, dona menininha”. “Eu também te amo, meu filho”, respondeu ela.
Durante o inverno, dona Nilzete costumava tomar um solzinho pela manhã e eu me sentava ao seu lado no quentinho gostoso. Muitas vezes eu ia até ela apenas para beijá-la, atrás daquele carinho de mãe que às vezes me faz falta.
Ontem, uma vez mais, dona Nilzete se dirigiu ao portão. Mas desta vez foi diferente. O portão voltou a lhe trazer alegria. Seu Lula estava lá do outro lado, onde a esperava cheio de luz. E sorrindo foi logo dizendo: “Ah, dona menininha, dona menininha... Chega de saudade, mamãe! Vem pra cá com o papai. Sou todo seu. Eu sempre fui”. Olha só! E não é que ela foi mesmo? Dona Nilzete atravessou para o outro lado. De mãos dadas com o amor, foi-se embora portão afora.
Esta madrugada, recebi a notícia pela Dani. Logo, Igor e eu, fomos para a casa de dona Nilzete, abraçar as meninas. Quando as vi, o peito apertou por elas. Eu já havia passado por aquilo, então sabia o que estavam sentindo. Não é fácil perder a mãe. Tentei distraí-las, ocupá-las com alguma coisa para que seus corações respirarem um pouco. Saí sem avisar e voltei com pães e frios. Propus que fizéssemos lanches para levar ao velório.
Dada hora, saí para fumar. O Igor veio, falou comigo e foi à nossa casa, preparar uma garrafa de café. Eu ainda estava nervoso quando algo me chamou a atenção para o portão ausente. Olhei aquela falta por alguns segundos e senti uma paz seguida de uma saudade prematura. Aquele carinho que eu tanto gostava, tornei a perder. Estava triste, mas, naquele momento, meu coração se encheu de alegria. Percebia que a vida novamente havia demonstrado que, aqui e ali, espalhada no mundo, tem gente que é anjo. Feliz de nós quando o encontramos.

Portanto, obrigado, dona Nilzete. Agradeço por tê-la conhecido. Adeus, dona menininha, mãezinha da rua. Vou me lembrar para sempre da senhora quando me sentar ao Sol nas manhãs frias de inverno, pois com a lembrança de seu sorriso e de seu beijo terno eu me aquecerei.

sábado, 9 de novembro de 2013

A beleza que nos cerca

Olhe bem para os meus olhos. Eu vi as estrelas. Por um poço aberto sobre a minha casa, entre as nuvens que fechavam o céu, elas cintilavam. É raro semelhante esplendor na cidade grande. Mas é natural que brilhem mais antes da alvorada, quando a noite é mais escura. Na hora mais escura, as estrelas se mostram mais brilhantes. E também haviam alguns vapores arroxeados que lembraram uma nebulosa distante. O buraco no céu me transportou pelas galáxias. Agradeci ao universo por tamanho espetáculo. A beleza nos cerca o tempo todo, e há quem só olhe a tristeza. Mas na hora não pensei nisso, centrei-me apenas no milagre que o céu me regalava e me senti cheio dessa luz. Enriqueci meu coração e brilhei como as estrelas. Nesse momento me perguntei quantas pessoas no mundo naquela mesma hora estariam contemplando as estrelas, quantos narcisos se espelhavam no lago cósmico, esperando a estrela gêmea lhe devolver o olhar. Creio que a maioria pensa diferente. Cansei de ouvir: “Oh, é nestas horas, diante desta grandeza, que percebemos o quanto somos pequenos”. Eu não penso assim. Pelo contrário. De nada vale o poder das estrelas de lançar sua imagem através do espaço se não há olhos que as vejam. São meus olhos os donos da força capaz de captar a luz das estrelas. Então nós nos completamos. Sem meus olhos elas jamais seriam vistas como eu as vejo. E as vejo com o coração. É minha alma que as sente e as transforma em maravilhas. As estrelas só cintilam quando nos estão olhando, e brilhamos quando retribuímos o olhar.

(Kizzy Ysatis, São Paulo, 8 de novembro de 2013)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Entre a honra e a enxurrada.


Há poucos dias, em que a chuva fez a rua escurecer, sai no terraço e vi passar uma sombra assustadora volateando. Um morcego? Não, uma raridade. A mariposa imperador. A maior do mundo, pelo tamanho se sabia. Nossa! Soltei o grito de alegria. Há pouco me surpreendi com uma pepita de ouro sobre o raminho verde que – graça à chuva – vencia o concreto no corredor do quintal. Parecia uma flor, mas era uma mariposa dourada e do tamanho da minha mão. Tinha o corpo rajado como um tigre e um casaco de pele sobre os ombros, como um leão. Estendi meu dedo bem recebido. Sobre a palma notei que lhe pesava a agonia de seus momentos definitivos, a asa já não prestava mais. Parecia em paz, mas borboleta não tem voz, não grita. Como saber se está aflita? Lembrei-me de uma prática pagã que diz que se você matar a primeira borboleta que ver em janeiro, terá sorte o ano inteiro. Mas não era uma borboleta, era sua parenta; na verdade, a mesma coisa. A mariposa é a borboleta noturna. E, pasme, é mais forte; seu casulo é mais duro, precisa de tenacidade pra nascer e coragem pra viver, pois enfrenta os predadores noturnos. Maiores, ferozes, famintos. Aquele não era o fim digno que merecia: ser triturada pelos dentes afiados da gata, ou levada pela enxurrada da chuva no fim da tarde. Não, pensei sobre o que eu desejaria se fosse comigo e a resposta veio ligeira, indubitável. Eu ia fazer eutanásia na borboletinha, rainha dourada, tigrada. No entanto meu coração se apiedou. Frouxo! Covarde! Imaginei a imponente falando: Por que acha que tão tranquilamente subi na sua mão? Por que acha que eu vim parar aqui? É porque te conheço. Sabia que me notaria e me livraria de um fim doído e feio. Sei que é capaz disso. Sua alma não guarda segredos a minha espécie, somos nós as encarregadas de subir a alma do homem. Como ousa me desrespeitar assim? Conceda-me a dignidade a que vim buscar. Que bobagem, pensei. De onde tirei esses pensamentos? Vai, mariposa, irrite-me pelo menos. Mariposa pica? Não sei, mas se você me picar eu juro que te mato sem pestanejar. Não houve nada. Resolvi devolvê-la ao raminho, e então aconteceu. Pisei na merda. O corredor já tinha sido limpo. Como não vi a Kira, minha labradora gorda, preta e enorme vir defecar atrás de mim sem que eu percebesse? Que tipo de bruxaria é essa? Falei. Ah, aquilo me irritou bastante. Ela morreu assim sem dor. Eu a esmaguei num átimo. Sabia que não era a primeira borboleta que eu via. Mas fiz assim mesmo. Sem arrependimento, aliviei seu sofrimento. Pra mim o certo é assim: dar ao outro o bem que desejamos a nós mesmos. Até então ainda é janeiro, que a sorte nos brinde pelo ano inteiro. Abençoada seja!

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Casa na Floresta



Cidade de rios e de praias, montanha e floresta. No caminho de Tordesilhas, relíquia do tempo, história guardada pra outro momento. Na casa da bruxa, meu lápis me testa. Não é só ao trabalho que o corpo se presta! De noite há fogueira e também rola festa. Criar e escrever em nobre companhia, narrar novos sonhos, brindar fantasia! (de Kizzy Ysatis para Flávia Muniz)

sábado, 22 de dezembro de 2012


NATAL
Quando criança: (mesmo com o presépio) é quando o Papai Noel vem trazer brinquedos.
Quando cresço um pouco: (me conscientizo) é o nascimento de Jesus, e também é quando a gente se arruma pra desfrutar aquela comidinha gostosa com a família e trocar presente.
Quando fico adulto: (e me conscientizo novamente) é quando a gente janta com a família e tenta não discutir, mas rola comidinha gostosa e troca de presentes. É quando o Papai Noel se torna uma mentira que sou obrigado a contar pras crianças, e o presépio se torna um adereço.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Nossas vizinhas beatas, vira e mexe, criticavam minha mãe, que não participava das reuniões religiosas.

Quando ia brincar nas casas dos amigos, suas mães me pressionavam. O que para mim é errado. Envolver criança em conversa de adulto? Que maldade.

Eu estava assistindo desenho, na minha casa, mas perdi o interesse. De repente, achei-me olhado para a janela, com os olhos vidrados no silêncio da samambaia. Minha mãe passou por mim e percebeu essa viagem.

“O que foi, meu anjinho? Que carinha é essa?”

Então o assunto apareceu e eu perguntei por que ela não ia à igreja. A resposta veio com uma pergunta:

"Cris, tua mãe vai fazer o que na igreja?"

"Rezar"

"Rezar, eu rezo aqui"

"Mas a igreja é a casa de Deus"

"Que nada. Deus tá aqui, quer ver?"

Fiquei assustado e não disse nada.

"Vem cá com mãe"

Levou-me no quintal.

"Tá vendo?"

"Só as árvores e as plantas da senhora"

"Fecha os olhos e fica quietinho"

Fechei.

"O que você tá sentindo?"

"O vento"

"Não é o vento. Isso é Deus respirando"

Quando senti a brisa, pensando em Deus, deu vontade de chorar. Porque Deus tinha tocado em mim; no meu braço; no meu rosto. Alisou meu cabelo. Não ventava na Igreja. Lá, Deus não tocava em ninguém daquele jeito.

"Abra os olhos. Olha pra mãe."

"Tô olhando"

"Quando quiser ver Deus, olha pra natureza."

"Mas a mãe do..."

"Acredita mais na tua mãe ou na mãe dos outros?"

"Claro que na minha!" respondi, convicto.

"Ah, bom"

Ela me deu um cheiro e voltou aos afazeres. Era firme e carinhosa ao mesmo tempo. Uma leoa. Perto dela, eu era uma gelatina. Entramos e eu voltei a assistir desenho. Mas algo na janela puxava meu rabo de olho. Olhei. Era a samambaia acenando. Só aí que eu me toquei que antes não estava ventando.

domingo, 26 de fevereiro de 2012


Eu me lembro, que quando minha mãe partiu, descobri que a morte era a coisa mais dolorida do mundo. No entanto, quando a tia gorda veio cuidar da gente, descobri que o amor confortava, e que nós aqui em casa não estávamos sozinhos. Lembro-me que quando meus primos Douglas e Danilo vieram nos visitar, eles me alegraram. Eu os levei pelo bairro para passear, então me veio a ideia de lhes mostrar um lugar especial. Não disse o que era, mas eles confiaram cegamente. Embarcamos no trem e fomos para Mogi das Cruzes. Eu os levei para a montanha mais alta. Pelo caminho, brincamos e rimos de nossas piadas mais bobas. Douglas reclamou da subida, mas não desistiu. Ele não sabia, mas era um lugar onde certa vez levei minha mãe. Chegamos ao alto da montanha, quietos e pasmos. O cansaço de Douglas pareceu se dissipar com as nuvens. Seus olhos percorreram o horizonte de uma paisagem lindíssima. Na descida, voltamos a fazer gozações e Douglas brincava: “Cris, você trouxe a gente aqui pra subir esse morro?” Perguntei se ele estava arrependido. Ele disse que não. Lá de baixo, o morro era tão alto e distante que parecia impossível imaginar que tínhamos subido. Aquela imagem ficou gravada na memória. Fomos ao shopping lanchar. Depois, voltamos para casa. Pelos anos que se seguiram, todas as vezes que me encontrava com o Douglas e o Danilo, a gente se lembrava de nossa aventura. Um dia, a tia gorda disse tchau. Tempinho depois, o Douglas disse adeus. Não sei o tamanho dos meus dias, mas hoje posso dizer, com certeza, que tanto do outro lado quanto deste há quem nos espere. Há quem nos ame. Há quem nos ampare. E que bom que o Douglas voltou a enxergar, pois agora poderá revisitar a montanha quantas vezes ele quiser, sem se cansar.

Boa viagem, primo.
Com carinho,
Cris.

sábado, 19 de novembro de 2011

Oração do sábado à noite:

Quero uma bebida que me faça delirar;
Uma música que me faça ferver;
Uma lembrança que me faça chorar;
Um beijo que me faça verter.
Kizzy Ysatis (SP, 19/11/11)

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Gritos na trovoada


Eu ouvi o trovão e não tremi.

Ouvi o trovão e ele me chamou.

O trovão arrebenta meteoros e muros.

Ouvi o trovão e não tremi.

Peguei em armas e encarei a chuva.

Este é o ano da tempestade,

E eu sou o trovão.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011


HOJE É 11 11 11

A vida é morte. A morte é não se saber vivo.
Quem é aquela mulher de 30 colhendo flores há 30 anos?
Eu sei! E tantos passam sem passar...
e os que existem existem por serem notórios.
Ah, cansei-me de me diluir em personagens diversos.
Sou meu melhor personagem.
Quero mais coragem para me jogar no abismo de mim,
passar passando, deixar cicatriz no tecido do mundo,
esgarçar a alma de tanto viver.
Morrer... me sabendo vivo.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

SOBRE LYGIA

Este livro me é especial porque a assistente dela me ligou para dizer que ela tinha um presente para mim - ela se lembrou de mim! - e que eu fosse apanhá-lo na Academia de Letras. "Diga na portaria que você é meu convidado", isso ela mesmo disse. Ela me deu o livro autografado. Meu nome estava certinho; e antes dele vinha a palavra: escritor. Depois que os outros ancestrais já haviam ido pra casa, somente ela e eu ainda insistíamos nas risadas e conversa molhadas na cerveja gelada que o mordomo Luis nos servia. Fumávamos porque podia. Ora, quem manda alí é ela. Eu pouco falava... apaixonado por sua voz e narrativa, tal como outro homem descreve bem abaixo:

"...rimos, folgamos e bebemos. Não dramatizamos as diferenças na hora da discussão – entre escritores portugueses e brasileiros só por má-fé e cínica estratégia se instalará a discórdia. Recordo a hora do café da manhã, com o sol a entrar triunfante pelas janelas. Ao redor das mesas o riso dos novos não soava mais alto nem era mais alegre que o dos veteranos, os quais, por muito terem vivido, gozavam da vantagem de conhecer mais histórias e mais casos, tanto dos próprios como dos alheios. Não é uma ilusão minha de agora a imagem de terna atenção e respeito com que todos nós, portugueses e brasileiros, escutávamos o falar de Lygia Fagundes Telles, aquele seu discorrer que às vezes nos dá a impressão de se perder no caminho, mas que a palavra final irá tornar redondo, completo, imenso de sentido.

Disse que conheço Lygia desde sempre, porém a medida deste sempre não é a de um tempo determinado pelos relógios e pelas ampulhetas, mas um tempo outro, interior, pessoal, incomunicável." (JOSÉ SARAMAGO)

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Soltei-me dos grilhões que me prendiam.

Ora, não vou mais me submeter às tortuosas horas de puro desconforto em prol das pessoas que amo. Não vou mais aceitar convites de festinhas de crianças de filhos dos outros. As crianças não me incomodam, porque não estão lá para as aparências, mas somente para a diversão, e isso é tão minha cara. Posso muito bem visitar meus amigos e seus filhos, meus parentes e seus filhos, em horas nossas; mas não mais participar dessas cerimônias que celebram as convenções das quais não faço parte e tampouco quero fazer. Por quê? Ora, os humanos se multiplicam, e isto eu acho natural. Fico feliz pelos amigos e irmãos porque a felicidade dos meus é a minha felicidade. No entanto incomoda-me seu olhar de piedade ou o de alguns de seus convidados “Oh, pobre dele, é solteiro e não tem filhos”. Isto eu não acho natural, só acho burro, acho estúpido que diminuam a capacidade de reflexão, o pensamento, à altura de sua fisiologia. Isto eu acho vulgar. Pois não sabem sequer distinguir que o que é bom pra eles não necessariamente precisa ser bom pra mim, portanto não me faz falta. O terror que sentem em não ser mais um, de não fazer parte do grupo, não me assombra. Gosto de ser singular. E quando não são capazes de entender ou respeitar meu ponto de vista, muito embora, como já explanei, eu entenda o deles, é quando me emputeço; é quando não tenho piedade nenhuma, mas nojo. Eu não sou piedoso? Sim, sou, mas nem sempre. Os que eu amo e me amam não possuem a intenção de me cutucar, o fazem sem saber; no fundo, sinto a pena em seus olhares e isso me causa algum desconforto, coisa que de qualquer modo antes tolerava pelo bem de estar geral, do qual de hoje em diante não vou mais me doar. Eu os curtirei em horas nossas, e horas coletivas só quando comemorarem a amizade ou o dia de seus anos. Sobre festas de família, quando quiser ir sozinho, eu vou. Quando quiser levar companhia, um amigo ou amiga, que seja, para ter o que se conversar extra os papos familiares, e não permitirem, porque meu convidado (a) “não é da família” nem cacho meu, então eu declinarei. Sobre aos enlaces, deixarei bem claro: não vou durante a parte religiosa. Só irei à festa, se quiser, convide, senão, dou de ombros. Em resumo, para ajudar os retardatários antes que abram a boca pra comentar estrume, não me incomoda não ter o que outro tem, nem ser como ele é, incomoda o olhar do outro, não do outro, mas do próximo, dos meus, ou mesmo seus convidados, daqueles que não são como eu ou infelizmente estão aquém de uma compreensão superior.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

O LIVRO É ETERNO

Devo desculpas aos meus leitores cariocas, tivemos de cancelar o lançamento na Bienal, o livro não ficaria pronto a tempo. Os motivos são óbvios: as mudanças (todas para melhor, não me arrependo). Quem me conhece sabe que jamais colocaria à venda um livro porco feito às pressas. Qualidade em 1º lugar, respeito meus leitores. Muitos autores se entristecem nesta situação, mas é porque se esquecem do essencial: a Bienal dura só alguns dias, o livro é para sempre.