Estou de passagem neste mundo,

Mas deixo aqui o registro de minhas palavras.

Eu sou o peregrino do tempo.


quinta-feira, 5 de junho de 2008

DIÁRIO DA SIBILA RUBRA
O retorno das bruxas

Prólogo em três partes

parte um:

Uma casa. E nesta casa a força de todas as mulheres do mundo. Uma casa grande, escurecida pela umidade. Tão velha e silenciosa que até parece mal assombrada. O que será que há dentro dela? Por esta casa já andaram boas mulheres, mulheres corruptas e mulheres que foram ou tiveram de ser essas duas coisas. Oh, casa calada que reverbera histórias que ninguém escuta; testemunhos que vagam por ti, nobre casa, gravados no papel de parede. Seus móveis são como ecos virgens de imagens vividas e desenhadas sobre o manto de tal poeira. Seu cheiro manso e por vezes arredio escorre pelos tecidos e reflete em sua textura a consumação dos dias mortos.

Um ano depois da Páscoa de 2002

Chove lá fora. Relâmpagos inundam a casa com seu inferno índigo dos deuses do passado, aumentam sombras, e nos revelam a silhueta da dama herdeira de um segredo. E desses raios reagem trovões. Rugidos que prenunciam indesejada visita. Sussurram para a dama: Ele está chegando! Ele está chegando! Quem? E a pergunta ecoa como um sino que retine: Quem está chegando? Ela desce a escadaria trazendo nas mãos o livro que acabou de ler. Leva os olhos nas janelas. Caminha até o meio do salão; olha a escuridão e espera como nunca antes esperou. Está inquieta, espera o inesperado. Algo inusitado a surpreende: a pedra vermelha no colar de ouro passa a emitir certa luminosidade e isso a denuncia. O coração dispara, galopa no peito. A dama leva a mão no rubi num reflexo condicionado. A luminescência cessa enquanto ágil inteligência percorre a esfera do pensamento na busca da resposta para o curioso sinal. Ela deixa o livro sobre empoeirada arca que jaz em comunhão com outras mobílias tão antigas quanto. Sua mente vagueia, mas não há tempo; no seguinte instante capta o perfume estonteante. E o inesperado acontece.
Entra o corvo.
É ele. É a ave sarcófaga que chega. O pássaro negro plana; passa por ela e não pousa; arremessa-se no alto da escadaria e dali expande uma fumaça branca. Ela não se vira para ver, embora imagine quem seja. Ele está ali! O azul acende a casa e celebra a entidade que se ergue da névoa dissipada. Evanescente.
– Boa noite, Alessandra.
A voz apurada ganha a atmosfera em eco secular e tem qualquer coisa de maldita. Alessandra fecha os olhos e estremece, perde a compostura. O hálito dele é brisa congelada que roça à nuca. Ela respira profunda e lentamente. As velas vão se acendendo por vontade própria e a sala se ilumina. Vira-se para ele com a fé restabelecida desenhada na face.
– Boa noite – corresponde ela com a polidez da cortesia. A saudação, dita com firmeza, vence a casa com magnífico relevo na voz potente. Assim mostra que também tem atitude.
Alessandra ainda está levemente abismada, mas disfarça bem. Aquela pessoa macabra que conheceu no livro jaz encarnada à sua frente. E a descrição do livro, por mais nítida que fosse, não lhe faz jus.
– O vampiro Luar, eu presumo.
– O próprio! Minha fama me precede.
– Pudera. Trazes o mal na bagagem.
– E olha que a carga é grande. Um trem.
Ele vai descendo as escadas como um imperador que recepciona seus comensais. Que olhos grandes ele tem, pupilas dilatadas como as de um gato noturnal.
– A senhora me desculpe por ter entrado sem bater.
O arquétipo do herói romanesco. Isso a encanta.
– Não foi muito educado da tua parte, mas aceito as desculpas.
Tem toda a semelhança de um Don Juan de Byron, de um conde Lopo de Azevedo, com a capa preta cobrindo-lhe apenas um dos ombros e o excesso dela vem dobrada no antebraço.
Ele estaciona no meio da escadaria para admirá-la. Madura na idade e enxuta na beleza preservada, Alessandra exibe prodigiosa cabeleira, cuja tonalidade ele reconhece e vibra, pois qual uma cachoeira de fogo, ela despenca em pencas de cachos largos que atraí os olhos e aviva a alma; vastíssima e sobrenatural como a dele que, de diferente, só tem a cor.
– Não estava preparada para receber-te.
– Sorte minha.
Há o silêncio.


5 comentários:

Anônimo disse...

Olá!
Finalmente o filhote nasceu?!!!
Que felicidade, hein?!


Darkisses,
Lu.

Somerset disse...

Irei procurar Lunar Park e também estou com uma lista enorme de livros para ler assim que tiver tempo começo República dos sonhos de Nélida Piñon, mas mesmo assim a ansiedade não baixa.

Estou fazendo o possível para estar na 20º BIL para o lançamento do DSR, não vejo mesmo a hora de tê-lo.
Abraços!

Kizzy Ysatis disse...

Lu

Ainda não nasceu. A imagem é uma versão digital. Mas já está de nove meses, rs. Darkisses.


Mari

Leia Nélida primeiro que você vai sair no lucro. Alguem capaz de me emocionar com uma crônica sobre a amizade com uma lagartixa, só tinha de ser mesmo imortal, aliás, a primeira mulher a presidir a ABL na história.

É especialmente para vocês que acompanham o blog e esperam junto comigo o nascimento das sibilas, é que estou postando o PRÓLOGO do livro..

Espero que estejam gostando.

kisses for kizzy

Anônimo disse...

Ah tenho que ser bem sincera amoreco, sobre ess aprimeira parte... Eu n�o posso dizer que gostei, pois n�o estaria falando a verdade!! Eu A-DO-REI!!! hheheh vamos pra segunda, sigam-me os bons!
Lizy Tequila

Kizzy Ysatis disse...

Lizy, mas que susto!