
TROCA DE E-MAILS COM UMA LEITORA
Olá, Kizzy! Tolamente, eu espero que essa mensagem não se perca em sua caixa de entrada de e-mail. Talvez existam dezenas, ou centenas de mensagens iguais ou melhores que essa que eu escrevo, mas, mesmo assim, há em mim uma pequena esperança de que a leia. De que dê a ela apenas um pouco de sua atenção.
Não faz nem quinze minutos que acabei de ler a última página do Clube dos Imortais. Assim que o vi, na livraria, me interessei. Não apenas por se tratar de vampiros, tema que exerce profundo fascínio sobre mim, mas por ser de um escritor brasileiro. Mais acostumada às obras vampirescas de Anne Rice, encenadas em distantes Europas, fiquei feliz ao poder ler algo mais próximo da minha realidade e, ainda sim, tão palpável.
É claro que por gostar do gênero, já experimentara antes obras do André Vianco. Mas devo admitir que não me cativaram como eu gostaria. Não como na sua obra. Talvez porque em seus escritos poéticos, Kizzy - se é que me permite chamá-lo dessa forma -, os vampiros não sejam apenas inimigos, ou mesmo monstros. Não, a monstruosidade é apenas uma faceta de seu caráter, e acabamos nos apaixonando também por sua minguante humanidade, tão mais sensível, tão mais profana, tão mais autêntica.
Outro fato que me pegou desprevenida e me fez amar o livro desde o começo foi a profusão de poesias e trechos belos, trágicos e, por vezes, mórbidos. E a constante presença de meu poeta preferido, Álvares de Azevedo! A citação de "Meu Sonho", que adoro entoar de cor pelos cantos, foi um júbilo para mim. Mesmo porque, nos modestos textos que escrevo em meu computador, já usara esse mesmo e maravilhoso poema em um conto sobre vampiros. Para mim, ele soa como o próprio hino da espécie, sua essência, por assim dizer. O delírio fatal, não é mesmo?
Realmente, fui cativada pela saga de Luar, o pobre e torturado Raul, que às vezes me fazia odiá-lo - principalmente através das recordações de Patrícia -, outras me obrigava a amá-lo, como se eu, assim como Luciano, também fosse embargada por seus discursos eloqüentes, sua retórica deliciosa e seu fascínio imortal. A cena onde ele dançou no Madame Satã pareceu ganhar vida em minha mente.
E cada um dos personagens ganhou vida através de suas palavras. Luciano e seu ceticismo apaixonado, lutando contra uma devoção pelo vampiro ainda mais forte. Cláudio, que me surpreendeu, tornando-se no fim, ao menos em minha imaginação, onde a história nunca termina, um legítimo caçador. Marta, que revelou-se muito mais do que se podia esperar, uma sibila rubra. Montserrat, que deu continuidade ao eterno ciclo profano da vida e da morte. Fausto, que me fez sorrir a cada vez que surgia, com ares de velho em seu corpo tão jovem, e maneiras tão finas, requintadas, fiel até o final. Patrícia, que revelou-se uma mulher, sibila e vampira tão ou mais forte que o próprio Luar.
Creio que, para o poeta, a maior satisfação, deve ser saber que aquela parte de si que foi traduzida em tinta sobre o papel alcança o patamar da imortalidade. Sim, pois, um livro pode ser queimado, esquecido ou simplesmente perder-se nas espessas brumas do tempo. Mas uma história que algum dia emocionou aquele que a leu ou a ouviu, alcança a proeza de viver para sempre. Diferente para cada um que a conheceu, mas eterna em sua essência. Para um poeta a vida nunca termina de fato. Essa é a verdadeira natureza de um poeta, creio. Imortal e viva em cada um dos que se alimentaram de sua arte, um pedaço de sua própria alma.
Foi um prazer ler o seu livro. E é ainda mais prazeroso poder expressar meus sentimentos sobre a obra dessa forma. Eu não espero uma resposta, porque o fascínio genuíno por um bom livro, ou por qualquer outra coisa na vida, é dessa forma. Verdadeiro, até simplório. Quase platônico. Simplesmente está feliz por poder expressar-se, sem esperar nada em troca. Apenas ficaria contente se lesse esse meu e-mail, sabendo que gostei muito do seu trabalho.
Adoraria ver mais livros como O Clube dos Imortais nas livrarias. E acho que o prêmio que ganhou foi mesmo muito bem merecido. Uma história bela, poética, tão bem estruturada, sustentada por apenas uma cruel e bela máxima: "O amor está acima do bem e do mal". E, de fato, o amor está lá presente em cada ato. De forma egoísta, como o amor por si mesmo que Selton sentia; ou de forma trágica, como o amor intenso de Raul por Álvares e, posteriormente, Luciano. No amor de Marta, profundo e fraternal; de Cláudio, vingativo e sem temores; de Patrícia, doloroso e contraditório; de Fausto, fiel e solitário.
Você escreve muitíssimo bem e, certamente, assim como A Fazenda Blackwood, de Anne Rice, o Clube dos Imortais vai também influenciar meus próprios contos vampirescos, embalados, como eu já comentara anteriormente, pelo ultra-romantismo de Álvares de Azevedo, e por todas as crônicas de vida, morte, amor e sangue que eu já tive chance de experimentar nos meus dezessete anos, seja em minha vida ou na ficção.
Tudo o que eu posso fazer, então, é agradecer. Obrigada!
Sinceramente,
Fiat Noctum. (Meu próprio e jovem pseudônimo, advindo do amor ao latim).
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Caríssima
Quase, em detrimento ao seu rogo, quase eu apaguei seu e-mail sem ler. O título estava claro para não ser percebido e não recebo centenas de e-mails de leitores como imaginou; eles pingam aqui e ali semanalmente na minha caixa de correio ora rasos, ora profundos (como o seu) e todos eles me estragam com críticas elogiosas que me põe a perigo de me achar bom o suficiente.
Acredite, nunca, nunca se está bom o suficiente (esse pensamento é encorajador e nos salva do ego mentiroso que, se não for domado, assassina o talentoso); e por fim creio que nem todos que lêem se prontificam a escrever.
O fato é que seu e-mail estava enturmado com uns spans que apago num tiroteio de clicar sem ver.
Alegra-me tê-lo visto a tempo porque me emocionei ao lê-lo. Não há júbilo maior para o artista que o reconhecimento do público; e melhor quando este triunfa em se expressar de forma tão bem articulada quanto você fez. Seu e-mail é uma das cartas mais apaixonadas que recebi sobre o Clube dos Imortais, a nova quimera dos vampiros e no final espantou-me por descobrir que você, com apenas 17 anos, escreve tão bem. Há futuro para o Brasil. Por esses motivos todos é que peço sua permissão para publicá-lo em meu blog, mas asseguro-lhe que seu endereço eletrônico será resguardado.
Obrigado!
Abraços cordiais,
Kizzy Ysatis
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Olá mais uma vez!
Bem, primeiro perdoe-me pela extensa demora por essa resposta. Minha justificativa é simplesmente a imprevisibilidade das máquinas: Meu computador quebrou um dia depois de ter-lhe enviado aquele primeiro e-mail. Mas eu jamais deixaria de responder, de qualquer forma!
Você não tem idéia o quanto eu fiquei feliz ao ver sua resposta! Eu, de fato, não esperava por uma, apenas torcia silenciosamente para que você tivesse recebido meus elogios (que são muito merecidos, não importa o que diga).
Eu adoraria ver meu e-mail em seu blog! Seria, de verdade, uma honra! Muito obrigada pelo que disse, fiquei realmente muito feliz de ler. Poderia me passar o endereço de seu blog? Eu vou visitá-lo sempre que puder!!
Mais uma vez muitíssimo obrigada!! Fiquei exultante ao ler sua mensagem! É muito bom saber que grandes autores estão mais próximos do que se pensa, não em algum imaginário distante. É bom saber que são pessoas de carne e osso com as quais podemos conversar, mesmo que por alguns instantes apenas. De certa forma, é encorajador. Inspirador. E por isso eu agradeço muito!
Fiat Noctum.
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Fiat Noctum.
Agradeço mais uma vez pelo carinho. Nossa conversa foi publicada. O endereço do meu blog é:
www.kizzyysatis.blogspot.com
Apareça sempre que quiser e por favor nos deixe um comentário sempre que puder.
Abraços cordiais
Kizzy Ysatis