O cemitério da consolação
O que há de tão mórbido
Na fria beleza de São Paulo?
O cinza do céu e do concreto
Um futuro incerto
Na Consolação existe um cemitério
Que não consola os anjos que lá choram
Não há nefasto mistério
Os sonhos permanecem, mas alguns se foram.
Imagens vivas em concreto imóvel
Contemplam almas que daqui partiram
Segredos guardam sobre a outra vida
Por entre sombras que nunca se viram
São Paulo traz em si o movimento
De cada ser que possa abrigar
São Paulo tem guardada em cada pedra
Uma ruína sempre a renovar
Beleza opaca tem o cemitério
Vastas fortalezas de silêncio império
Em cada rosto que por lá se esconde
A triste ânsia de buscar o etéreo
Alguns por lá foram esquecidos
Outros constantemente visitados
Noturnos de preto vestidos
Poemas de poetas calados
É lá que todas as diferenças somem
É lá que a vida cumpre o seu destino
É onde muito velho morre homem
Qu’é pr’um dia renascer menino
Simplicidade, luxo, pedra, mármore
Sempre saudade no Consolação
Talvez na morte se conheça a vida
Talvez São Paulo tenha um coração
Que não consola os anjos que lá choram
Mas que nos ensina uma lição
E desejamos aos que já se foram
Que na morte encontrem libertação
O que há de tão mórbido
Na fria beleza de São Paulo?
Gente morta que nunca viveu
Gente viva que já morreu
Kizzy Ysatis & Rafael Alfieri
São Paulo, 1999