Estou de passagem neste mundo,

Mas deixo aqui o registro de minhas palavras.

Eu sou o peregrino do tempo.


quarta-feira, 24 de março de 2010


A FESTA AZUL, A FADA VERDE E A VITRINISTA DISC-JÓQUEI

Brincar de viver é treinar pra morrer. Há uma ineficácia voraz que conduz a frase para um eterno insucesso de não ser nem estar. Quero bater na hipocrisia. Cuspir na cara dela seria cuspir na própria cara. Como repudiava as garotas daquela festa. Mas se cuspisse teria de volta o jorro de catarro. Deus! Mas o que é isso? Pensou a Vitrinista que queria ser DJ.

Foi convidada de última hora para festa porque algumas pessoas desistiram; e o anfitrião excêntrico e concêntrico como Dali não queria a sala vazia. Ela sabia, ele disse. A Vitrinista foi mesmo assim. O conheceu num salão de moda. Ela queria ser DJ mas não tinha emprego, ele arrumou seu emprego de vitrinista na Boutique da amiga rica.

Muitas amigas ricas ele tinha, outras apenas metidas à rica; e ele... Bom, isso não vem ao caso. O que falar dele que não seria pior do que falar de si mesma. Só falamos dos outros; de nós, às conquistas; dos outros, o fedor e a dor. Mas ele falou que ia fazer e fez. Uma festa fabulosa. E tudo estava assim sombrio e deslumbrante.

Muitos adolescentes! Um ou dois coroas, uma ou duas coroas, mas coroas loucos. Tatuados e bêbados, dos que não censuram; dos que não os chamam de aborrecentes; dos que vêem a turma teen como iguais adultos. Estes são legais. Aceitos. São como pilares. Trazem uma falsa sensação de segurança na ausência de pais indigestos.

Sem dúvida, uma festa adolescente; e seu amigo trintão dava a festa especialmente para eles. Queria se sentir mais jovem. É um vampiro. E eles, garotos perdidos. Dava-lhes ideal e eles o nutriente, a juventude. E também platéia. No palco cultivava flores. Podava, colhia e algumas apenas regava a contento. Que estou fazendo aqui?

Ninguém quer ser a mulher-invisível. Todas querem ser a mulher-maravilha. Buscam ser diferentes de modo tão parecido que acabam sendo todas iguais e quem é realmente diferente é repudiado, Como eu. Como se estragam. Como se entregam. Esse amanhecer indolente e turvo a comovia sobremaneira.

É tudo tão plástico. Artificial, superficial. E por que então é divertido? Quero pra mim tanto e tanto dessa superficialidade... Parece fácil. É fácil, basta fechar os olhos e ser medíocre. Ridícula. Somos o exagero. Vamos perigar gravidez. Jorro. Vomitar beleza, salpicar odor, silhuetas disformes, ensaio de sobrevida, tipos animais. Enjôo.

Pressão, pouca luz, tom azul e fumaça; música, tilintar do gelo, conversa picada e puro desprezo; raras olhadelas pontuadas e pontadas de querer morrer no vaivém de desvairada súplica. O querer ser outro, ser de novo e não ser ninguém. Nem docinho de coco nem bolinho de cocô. Culpa-abandono. Mentiras ininterruptas soltas no ar.

Acocorado sobre ela no sofá. Ele está bêbado, não está? Quantos anos tem? Ela não tem mais que quinze, ele dezesseis. Virgens desesperados. Bocas de batom idêntico se beijam e os meninos de lápis e piercings se enroscando... Por que repudio tanto o que invejo? Conflito e loucura. Sem nexo. Balas, remédios e mentira. Muita mentira.

Sexo, sexo. Na cabeça, sexo. Se não tem sexo, substitui por outra porcaria. Mas na cabeça, sexo. Não se enxergam. Não vai rolar, mas a insistência é patética. Para outros funciona que é uma beleza. Intermináveis blás onde sobra o termo “tipo assim” e “tá ligado”. Não vai rolar mesmo.

Ô felicidade fugaz. Eis aí a incessante busca desse estado de espírito. Frivolidade e mesquinhez. Pústulas infindáveis. Nessa feiúra cantamos à beleza de ser alguém que pintamos; alguém que queríamos ser ou simplesmente escapamos; alguém que amamos; alguém que nos inspira a brincar de ser quem não somos.

Por parecer estúpido, é belo. Nonsense. Por parecer sem nexo faz todo o sentido. Do que é fino e finito, do que é suave e que delicadamente intumesce. A Vitrinista escreveria no diário: “A fada verde voou por ali e pousou em mim. E nesse afã eu me apaixonei por quem me retribuiu o olhar. Fugi. Mas roubei pra mim o manequim popstar”.

Kizzy Ysatis
25 de março de 2010

2 comentários:

Claudio Brites disse...

hum, teríamos aqui uma certa vaidade morta?

Anônimo disse...

rsrsrsr possivelmente.
k