Estou de passagem neste mundo,

Mas deixo aqui o registro de minhas palavras.

Eu sou o peregrino do tempo.


segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Aqueles que habitam o Paralelo Noturno

XV - Tempo de perdão

“Eu devo vencer o egoísmo. Estar ciente das minhas mágoas, medos. Aceitá-los. Seguir adiante. Absorver o entorno. Compreender. Expandir-me. É o que a deusa espera de mim. Nada é mais simples do que parece, e no entanto tudo é claro e manifesto”.

Elaine de Voltaire e Marta Morgado se observam em silêncio. Marta ainda com a mão no rosto matizado de vermelho pelo tapa ligeiro que levou. Elaine segura às próprias mãos cruzadas no ventre. Os olhos de Marta, de um azul indizível e cristalino, tremem de agitação, enquanto Elaine segue imóvel à semelhança de uma rainha egípcia. Tudo ocorre num átimo. Uma miríade de pensamentos devasta a alma da jovem matriarca. A antiga matriarca, por sua vez, aguarda com paciência a jovem chegar a um denominador comum.

“Elaine espera minha reação. Não está me punindo, está me testando. O tapa não foi um ato passional. É o que ela quer que eu pense. Quer saber se agi ou agirei por impulso, sem temperança, ponderação. Sem respirar. Ela está me treinando. Treinando para as provas que virão, quando terei pouco tempo para pensar. Quando não deverei agir por impulso gerado pelas químicas do corpo mas por uma reação intuitiva moldada pela alma-fêmea.

“Eu li o diário, sei o que se passou. Sei que as circunstâncias tem voz ativa e os erros da juventude nos capacitam para as sábias decisões da maturidade. Devo prosseguir, mas continuarei em tom de protesto. Agora sou eu quem vai testá-la, se é que posso. Elaine tem algo importante a dizer, senão não teria vindo”.

— Como pôde perdoá-lo? — perguntou Marta, refazendo a atitude.

— Quem ama perdoa.

— Pensamento cristão.

— Amor não tem religião.

— Não me peça para aceitar Fausto. Você mesma levou a vida inteira.

— Levei. Admito. Mas não significa que tu também tenhas de esperar tanto. Para isso deixei-te meu diário.

— Mas não posso obrigar meu coração.

— Tens razão, minha filha. Mas tempo é um luxo que não temos; taí o motivo da minha visita. Se souberes a verdade, poderás atingir um entendimento que a conduzirá a vitória. Uma guerra feia vem por aí e tens de estar pronta. Construir alianças. Não é tempo de rancor ou vingança. É tempo de perdão. Reconciliação e força.

— Não sei se posso.

— Não duvida de ti. Tens força. A Sibila Rubra jamais retrocede. Mas é natural que a presença de Fausto a machuque, são as lembranças infelizes do teu passado que gemem em ti a covardia. Já não tinhas aceitado da primeira vez...

— Primeira vez? Como assim?

— Tu és Virginia. Tu és minha única filha. Virginia.

“Eu devo vencer o egoísmo. Estar ciente das minhas mágoas, medos. Aceitá-los. Seguir adiante. Absorver o entorno. Compreender. Expandir-me. É o que a deusa espera de mim. Nada é mais simples do que parece, e no entanto tudo é claro e manifesto”.





[Continua...]
LEÃO NEGRO
A busca pelo vampiro Luar
Um romance de KIZZY YSATIS

4 comentários:

Kaa disse...

Em shock !
adorei, isso só me deixa mais ansiosa pelo livro!

Claudio Brites disse...

Um treinamento Zen, Marta leva um tapa na cara de Elaine e nós também.

Unknown disse...

Marta é Viginia?!
E eu achando que as Sibilas RUbras já não mais guardavam segredos de nós! 0____0

Anônimo disse...

Apenas o olhar acróstico da bruxa permite-nos ver e compreender sem o véu da ignorância, Marta está no caminho certo...e não está sozinha!